quinta-feira, março 30, 2006

Perdão Emília



Emília é nome de música.
A de Mário Lago, uma anti-homenagem, e a outra, a que lembro de ouvir minha avó cantar, é patética e ficou na minha memória. Eu voltei a ouvi-la já adulta, quando acabava meu curso de Jornalismo no Rio, e trabalhava no hoje extinto Teatro Opinião, em Copacabana. . Não, eu não era atriz, apesar do meu talento reprimido. E trabalhar é força de expressão. Eu era a moça da livraria. Por algum tempo, tomei conta do stand do teatro vendendo livros e programas das peças, um trabalho em que não ganhava praticamente nenhum dinheiro, mas onde me divertia bastante e conhecia muita gente interessante.
A música, cantada debochadamente por um grupo de samba muito bom, contava a história de um don Juan que ,cheio de remorsos por ter provocado o suicídio de uma donzela, ia pedir-lhe perdão na beira do túmulo. Minha avó só faltava chorar quando a ouvia no rádio. Eu a achava esquisita. Hoje vejo que ela é hilariante.
Sim, mas Emília é também o nome de uma amiga de minha irmã Alba, e ela não tem nada de trágica. Pelo contrário. É altíssimo astral. Só que como a maioria dos artistas , e das pessoas criativas, um pouquinho desligada. Emília me fez prestar mais atenção na minha indumentária praieira- o máximo do meu desligamento foi sair com uma saia cuja bainha estava apenas alinhavada, e com uma blusa pelo avesso ( em ocasiões diferentes, é claro).
É que Emília acordou radiante num domingo de sol também radiante. Pegou o biquíni, vestiu-o, e estava quase saindo quando o telefone tocou. Perdeu uma meia hora de sol batendo papo. Enfim, tchau, tchau. Amarrou a canga na cintura e se dirigiu para o Farol da Barra., praia que costumava freqüentar com os amigos e que ficava perto de sua casa. A praia estava coalhada de gente, o mar azul, e o barquinho a navegar....
Emília andou, andou, andou, como sempre, metendo os pés na água azul e morna.. Mas, dessa vez havia alguma coisa diferente. As pessoas a olhavam quando passava, uns de esguelha, outros fixamente, e ela achou estranho. Afinal, não era mais uma menina , e nunca fora uma miss. Que coisa!
Bom, fazer o que? pensou despreendida até que, ao passar por ela, um velho acompanhado da mulher olhou em sua direção desaprovadoramente, virou para o lado e cuspiu.
Que choque. Ela parou e pensou: “o que será que tem de errado comigo?”. Num balanço rápido veio a resposta: “Meu Deus, esqueci de colocar a calcinha do biquíni”.
Não, não estava nua (antes estivesse). Vestia uma calcinha velha, que aqui o pessoal mais antigo chama de calçola. Uma calçola branca, com o elástico esgarçado, manchada de tinta, e com alguns furinhos , que ela adorava usar dentro de casa..
Sentiu que o mundo desabava. O dia radiante não era mais radiante. Viu tudo negro na sua frente. . E não sabia se era de vergonha ou de raiva .
Diante do impasse, fez o que qualquer mulher sábia faria. Sentou numa pedra e chorou, chorou, chorou...

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